Alberto Beretta e Maria de Micheli foram um casal italiano muito santo, mas que não teve a sua santidade reconhecida pela Igreja através da canonização deles - nem mesmo um processo para tanto há, mas que viveram uma santa e fecunda vida familiar cujos frutos mais famosos foram a filha, Gianna Beretta Molla, santa já canonizada e o filho Servo de Deus Frei Alberto Beretta.
Alberto Beretta, o pai, nasceu em Magenta, na Itália. Com quatro anos, ficou órfão de mãe e foi colocado em um colégio interno. A ausência do contato familiar na infância o influenciou a querer, quando adulto, todos os filhos por perto. Era um homem de poucas palavras, sábio e de boas maneiras.
Maria de Micheli nasceu em Milão, na Itália. Sua mãe teve cinco filhos. Maria era a mais velha. Ajudava nas tarefas domésticas e nos cuidados para com os irmãos mais novos. Sempre foi muito inteligente e dotada de vontade forte. Era severa consigo mesma e amável para com o próximo.
Alberto e Maria eram jovens cristãos. Casaram-se em 1908. Foram morar em Milão, onde Alberto trabalhava. Tiveram treze filhos, cinco dos quais morreram ainda na infância. Gianna era a décima. Enrico, futuramente chamado Frei Alberto, o sétimo. O casal foi membro da Ordem Terceira dos Franciscanos. Com muita coerência e autenticidade, educava os filhos na fé.
Giuseppe, um dos filhos, ao falar sobre a vida familiar, disse: “antes de conhecermos a fé pelos livros e pelo ensinamento do catecismo, respiramos a fé na família através do comportamento e pela palavra de nossos pais”. Alberto e Maria criaram em casa uma atmosfera de amor, de paz, de alegria e de simplicidade bem aos moldes da espiritualidade franciscana.
A família Beretta enfrentou muitos sofrimentos e muitos sacrifícios. No entanto, tudo foi superado com profunda fé em Deus. A perda de cinco filhos, ainda pequenos, com certeza foi uma grande prova. Embora morasse em Magenta, Alberto trabalhava em Milão. Por isso, acordava todos os dias às cinco horas da manhã, participava da Santa Missa, tomava o café, pegava a marmita e partia para o trabalho. Ia de trem. A viagem demorava uma hora. Ao fim do dia, voltava para junto da família.
Para preservar a família dos perigos de epidemias, Alberto e Maria se mudaram, algumas vezes, de cidade. Os filhos passaram a infância e a adolescência em Bérgamo e Gênova. O estudo sempre foi muito valorizado pela família. Os pais desejavam que todos os filhos tivessem um diploma de curso superior.
Para a família, a fé era o centro, o fundamento de tudo. Pela manhã, Maria acordava os filhos com uma carícia no rosto e ia à igreja. Eles se aprontavam, iam ao encontro da mãe para começarem o dia na presença de Jesus. Diariamente, rezavam o terço em família. O amor pelas missões era transmitido por meio da intercessão cotidiana e da contribuição material, fruto das economias domésticas. No testamento deixado por Maria, constava que em seu funeral não deveria ter flores. O dinheiro seria doado às missões.
A família prezava muito o estudo. Quando os irmãos mais velhos se formavam e conseguiam ingressar no mercado de trabalho, ajudavam os mais novos a fazerem o mesmo. Dos filhos que chegaram à idade adulta, três foram médicos; uma, doutora em farmácia; alguns outros, engenheiros. Curiosamente, um irmão engenheiro, Giuseppe, se tornou padre diocesano na Itália, Virgínia se formou médica e foi ser religiosa missionária na Índia, e um outro, Enrico, que foi médico, também resolveu ser religioso missionário.
Com vinte anos de idade, Gianna já havia perdido os pais. Os irmãos se mantinham unidos. O vínculo familiar era edificado pela fé e pela corresponsabilidade. Enrico, após formar-se médico, resolveu abraçar a vida religiosa como franciscano capuchinho e missionário, assumiu o nome de Frei Alberto. Partiu para o Norte do Brasil com o intuito de fazer a diferença e aliviar o sofrimento do povo por meio do Evangelho e da medicina.
Ao chegar a Grajaú, no Maranhão, Enrico teve uma surpresa desagradável. Seu diploma e os documentos italianos não seriam reconhecidos no Brasil, e ele não teria autorização para exercer a profissão. Sem se deixar abater e movido por grande determinação, foi morar em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, onde refez a faculdade de medicina e aproveitou para fazer algumas especializações que lhe seriam úteis na missão.
Graduado no Brasil, retornou a Grajaú. Com a ajuda de um de seus irmãos, o Padre Giuseppe que era engenheiro, foi iniciada a construção de um hospital para atendimento gratuito dos moradores da região. Frei Alberto, nome religioso de Enrico Beretta, se destacou pela caridade com que atendia a todos os enfermos e a todos os necessitados. Dedicou- -se, de modo especial, ao cuidado daqueles que sofriam de lepra. Construiu para eles um centro de acolhida.
Depois de trinta e três anos de intensa vida missionária no Brasil, sofreu um AVC, que deixou como sequelas a perda da fala e a perda de alguns movimentos. Inicialmente, foi tratado no Brasil. Depois, foi transferido para a Itália, onde viveu, mais de vinte anos, junto de seu irmão sacerdote e amparado pela irmã, que também era profissional da área da saúde.
Gianna foi um terreno fértil às boas sementes plantadas pelos pais. Ainda na adolescência, fez um retiro e deixou anotações que serviam como seu programa de vida: preferir a morte ao pecado mortal, rezar todos os dias uma Ave-Maria para obter a graça de uma boa morte e buscar cumprir sempre a vontade de Deus. Participava, principalmente, das atividades pastorais da Ação Católica e da Sociedade de São Vicente de Paulo.
Tinha o grande desejo de ser missionária. Acompanhando por cartas o trabalho de Frei Alberto, em Grajaú, decidiu ir ao encontro do irmão para ajudá-lo. Fechou o consultório, começou a estudar a Língua Portuguesa e a se preparar para o desafio. Seus colegas médicos a desencorajaram por causa da fragilidade da saúde e das exigências do clima brasileiro. Seu bispo aconselhou-a a ficar na Itália, porque “quando Deus chama alguém para a missão, dá- -lhe também condições físicas”. Seu confessor lhe disse para formar uma família cristã, pois essa seria a sua missão.
Gianna permaneceu na Itália. Numa festa de ordenação sacerdotal, conheceu Pietro. Logo os dois perceberam que aquele tinha sido um encontro providencial. Após um breve e intenso período de namoro e de noivado, casaram-se. Quando Pietro se ausentava, por causa do trabalho, os dois trocavam cartas. É possível tomar conhecimento da vida dos dois pelas sessenta cartas trocadas.
Durante sete anos, a vida matrimonial de Gianna e de seu esposo foi feliz e fecunda. Grávida da quarta filha, Gianna descobriu que estava com um fibroma no útero. Por causa da gravidez, não havia possibilidade de tratá-lo. Ela insiste em que seja preservada a vida da filha e que a dela seja confiada à vontade de Deus. Faleceu uma semana após o nascimento de Gianna Emmanuela. Tanto o milagre para a beatificação, quanto o milagre para a canonização de Gianna aconteceram no Brasil, terra com que sonhara doar-se a Deus na missão.
"Seguindo o exemplo de Cristo, que 'tinha amado os seus... amou-os até ao fim', esta santa mãe de família manteve-se heroicamente fiel ao compromisso assumido no dia do matrimônio. O sacrifício eterno que selou a sua vida dá testemunho de que somente quem tem a coragem de se entregar totalmente a Deus e aos irmãos se realiza a si mesmo." São João Paulo II, na homilia da canonização.
-Extras:
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